O grupo de amigos de Catanduva (SP) que publicou nas redes sociais um vídeo em que aparece imitando o gesto feito por Elon Musk na posse do presidente norte-americano Donald Trump é investigado por apologia ao crime. O g1 procurou um especialista para entender que crime é esse e quais são as penas previstas em lei.
Nas imagens publicadas no sábado (25), o grupo, composto por 11 homens, reproduziu o gesto feito pelo bilionário na posse de Trump e que repercutiu nas redes sociais por ser parecido com uma saudação nazista (assista acima).
Na segunda-feira (27), a Polícia Civil instaurou um inquérito para investigar a conduta deles, após o vídeo viralizar, a pedido do Ministério Público.
Crimes previstos em lei
De acordo com o artigo 287 do Código Penal Brasileiro, apologia ao crime é o ato de fazer a defesa, promover ou incitar a prática de qualquer crime (em geral). A pena prevista pode variar de três a seis meses de detenção.
O advogado criminal Nugri Bernardo de Campos, especialista em direitos humanos e pós-graduado em ciências criminais, explica que o gesto pode ser considerado uma apologia ao nazismo. Conforme ele, no sistema jurídico brasileiro, a conduta é classificada como racismo.
Nugri explica que, no Brasil, há uma previsão específica para esta apologia na Lei do Racismo (7.716/1989), pois o artigo 20 dispõe que "quem praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional estará sujeito a uma sanção de um a três anos de reclusão e multa", explica Nugri.
Criada em 1989, a Lei do Racismo foi sancionada após a promulgação da Constituição Federal Brasileira, em 1988. À época, o objetivo era impedir o avanço de grupos supremacistas e nazifascistas que atuavam no país. No Brasil, os crimes de racismo são inafiançáveis e imprescritíveis.
O especialista explica que essa questão também pode ser interpretada ainda com base no 1º parágrafo do artigo 20, que faz menção ao ato de veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propagandas que utilizem a cruz suástica ou gamada para fins de divulgação do nazismo.
"Nesse caso, a pena pode variar de dois a cinco anos de reclusão", esclarece.
Em 2023, houve uma alteração no parágrafo 2º do artigo 20 da Lei do Racismo, que estabeleceu aumento da pena de dois a cinco anos de reclusão quando a divulgação do crime se dá por meio das redes sociais.
"Passamos por uma transição complicada até o surgimento da Lei do Racismo no Brasil, que foi a Ditadura Militar, antes da Constituição Federal de 1988, que desconsiderava vários direitos das minorias sociais. Ainda existiam resquícios da escravidão, pois sua abolição se deu em 1888, e a negação do Holocausto dos judeus na Alemanha também era algo que não podia ser esquecido pela humanidade e seguir avançando por outras nações", explica Nugri.
Investigação policial
Questionado pela TV TEM, o delegado Seccional de Catanduva, João Lafayette Sanches Fernandes, informou que a decisão de abrir a investigação foi tomada com base em um pedido do Ministério Público (MP).
Ainda segundo Lafayete, o promotor de Justiça Gilberto Ramos de Oliveira Junior recebeu ao menos quatro denúncias relacionadas ao vídeo, que viralizou nas redes sociais. Até a tarde de quarta-feira (29), os suspeitos não foram ouvidos pela polícia.
O que dizem os investigados
Por meio de nota enviada à reportagem, os investigados pediram desculpas e informaram que o vídeo foi gravado durante uma reunião entre amigos, a princípio sem intenção de publicação. Entretanto, um dos participantes fez a postagem. Segundo o grupo, a imagem foi tirada de contexto e gerou repercussão.
No texto, eles informaram que, na ocasião, conversavam a respeito da posse de Donald Trump, quando comentaram sobre o gesto feito por Elon Musk. O grupo disse que, então, decidiu repetir a ação ironicamente e gravar um vídeo para enviar a outro amigo que não estava presente no encontro.
"O episódio ocorreu em um ambiente privado. Um dos presentes ao encontro, porém, publicou uma fração do vídeo sem áudio em uma rede social, de modo que o conteúdo viralizou. Ao se dar conta do equívoco, a pessoa logo excluiu a publicação", explicam.
Os investigados informaram que reconheceram a falha ao "não ponderar sobre os efeitos que esse tipo de gesto ocasiona" e reforçaram que "regimes de extremismo, abominados por todos os integrantes do grupo, não devem ser banalizados ou normalizados".
"Não possuímos e nunca tivemos qualquer tipo de militância política, ideológica ou partidária. Diferentemente do que estamos sendo taxados por conta do vídeo, não temos e jamais tivemos qualquer relação com grupos ou ideologias extremistas e supremacistas", dizem.
"O vídeo não foi feito com intenções políticas ou ideológica, mas apenas como forma de interagir com o nosso amigo faltante do encontro. Porém, reconhecemos que a forma da interação com o nosso amigo foi infeliz e a publicação ficou descontextualizada, levando a uma interpretação equivocada dos fatos."